Poeta Jaime Huenún, sobre a tragédia da privatização da água no Chile
Em Osorno, a cidade em que eu cresci, a tragédia, a impotência e a inquietação são desencadeadas. Lá, quase 200 mil pessoas sofrem com a falta de água potável por 10 dias, contaminadas por erro de hidrocarbonetos. Cidade cercada pelo bullying e negligência de Aguas Barcelona (Essal) e pelas paródias e insultos discursivos dos representantes do governo. Terra de chuvas e rios, nascentes e estuários que hoje não tem água para seus filhos, seus idosos e doentes.
Oito dos meus irmãos e irmãs com suas respectivas famílias moram lá. Minha mãe, prostrada por múltiplas doenças, mal consegue acessar copos racionados de água pura comprados a preços elevados em supermercados. Há também um fim no estoque de água engarrafada nas poucas empresas que trabalham. Meus parentes dizem que das chaves ou torneiras – quando as “janelas” de 1 ou 2 horas de distribuição são abertas – sai água turva e azul, quando não literalmente preta. Milhares de pessoas não podem trabalhar, milhares de Osorninos e Osorno estão condenados a voltar no tempo.
Osorno é agora um subúrbio hindu ou africano: as pessoas se aglomeram em frente às cisternas dos caminhões com carrinhos de mão cheios de tambores, baldes e garrafas de plástico. Outros retornam à prática huilliche de beber água de nascentes.
Mais do que uma nação saqueada, nós já vivemos no que Paul de Rokha chamou de “A República Assassinada”; assassinado para pausar por impostos patrióticos e estadistas, por autoridades de todos os níveis a quem o serviço público não dá a mínima. Água, terra, ar, mar, sol: todos vendidos ao menor preço.
vídeo da tragédia local http://twixar.me/7JF1
Fonte: Luis Nassif – Jornal GGN